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sábado, 23 de fevereiro de 2013

ESTATÍSTICA E DESVALORIZAÇÃO DO PROFESSOR

Por Sonia Rodrigues.


Não sei como ainda restam professores em sala de aula se nas manchetes, Brasil afora, se repete o mantra que os baixos salários demonstram que professores não são valorizados. As manchetes são baseadas em estatísticas e a impressão que fica é que os professores continuam construindo a nação brasileira porque são otários ou incompetentes.
Uma vez, fui convidada para fazer uma oficina de escrita dentro de um dos presídios do Complexo Penitenciário de Bangu. Só as professoras entravam desarmadas naquele lugar que parece uma máquina de fazer doidos, uma sucursal do inferno de Dante, com homens pendurados nas grades em celas superlotadas. Aliás, me disseram que os guardas só entram em caso de motim. 
Como o ser humano sobrevive a, praticamente, qualquer coisa eles sobrevivem e uma parcela deles estuda. Participa de concursos de redação e se forma. Graças a quê? A dedicação dos professores que, apesar de ganhar pouco, gostam de ensinar, inclusive a presidiários. 
Li as estatísticas do IBGE e me pergunto: Qual a expectativa dos formadores de opinião em relação a alunos que desejam ser médicos? Alguém nesse país acha que ser médico é uma opção para os que são incapazes de ser outra coisa? Onde estão as pesquisas que investigam a relação direta entre vontade de servir e escolha da carreira de magistério? Onde estão as pesquisas sobre qual o profissional que mais influenciou alunos em situação de risco social a seguir adiante?
Por que não divulgar (ou pesquisar) o apreço da população pelas carreiras com ensino superior para avaliar se a carreira de professor é ou não é valorizada?
Não se valoriza uma profissão apenas pagando salários melhores. A valorização está também em destacar feitos e resultados.
Outro mantra do qual discordo é aquele de se aumentarmos os salários dos professores atrairemos os melhores alunos para a carreira. Por que os melhores alunos escolheriam uma carreira a respeito da qual os formadores de opinião não dão a mínima? Por que escolheriam uma carreira a respeito da qual não se produz estatísticas do grau de satisfação ou dos resultados?
Os melhores alunos, em geral, são os alunos da rede particular de qualidade, filhos da classe média. Não conheço um melhor aluno, jovem, disposto a enfrentar uma sala de aula de escola pública. A classe média ensina aos seus filhos que eles têm direito a escolher emprego porque serão sustentados pelos pais até arranjarem alguma carreira na qual sejam felizes. 
Os pais pobres, muitas vezes, esperam que os filhos arranjem um emprego o mais rápido possível. Para ajudar a sustentar os irmãos. Não fazem por que amam menos seus filhos do que a classe média. Fazem porque essa é a realidade deles.
Valorizar a carreira do magistério é mostrar aos alunos da escola pública que a licenciatura é uma alternativa profissional para eles. Melhor se tiverem vocação, mas que deve ser levada com seriedade e competência mesmo se for apenas um emprego. 
Aliás, qual é o problema de estudar para ter emprego? Algum médico ou engenheiro estuda para não ter emprego? Todos os médicos têm vocação para cortar gente, curar gente, lidar com o sofrimento? Sem contar a dificuldade de aferir se, aos 16, 17, 18 anos, idade em que os alunos entram na universidade, a vocação, para qualquer carreira, está consolidada.
Existem milhões de alunos, que poderiam ser os melhores, abandonados à própria sorte, só contando, para aprender o mínimo, com os professores que representam para eles a chance de serem inseridos à enciclopédia cultural e científica.
Por que não nos concentramos nesses professores, heróis anônimos que estão em sala de aula? Ah, não se faz política pública com heroísmo, dirão alguns. Bobagem, só se transforma a realidade com heroísmo e responsabilidade individual. 
Tornar os professores que estão na sala de aula mais eficazes e mais estimulados é uma meta que pode ser cumprida pelos responsáveis pela formação dos licenciandos, pelos pesquisadores, pelos gestores municipais, estaduais, por organizações como Todos pela educação. O governo federal, inclusive, tem se empenhado nesse sentido  
O que é problemático é que as estatísticas só consideram renda. Talvez porque a mentalidade vigente entre os formadores de opinião, inclusive os que lidam diretamente com licenciandos, é a de que a questão salarial é o mais importante.
Comparar salário de professor com o de médico rende manchete, mas não resolve nem o problema da educação, nem o do desemprego entre jovens que terminam o ensino médio e param de estudar. Não resolve também a desvalorização da categoria.
FONTE:http://oglobo.globo.com/